quinta-feira, 1 de setembro de 2016

o amor acaba.

          Alguns poetas, apaixonados e iludidos, dizem que não; "o amor de verdade dura até a eternidade". Nos próprios filmes, o tal do "felizes para sempre". Mas eu não acredito em nada disso, afinal, o amor vem com uma dose bem grande de realidade.
          Com isso, sinto informar-lhes, caros leitores sonhadores; o amor acaba. 
          Numa manhã fria e cinzenta; em uma tarde ensolarada. Em alguma pizzaria antiga de bairro, daquelas que passam de pai para filho; em botecos quaisquer de esquina; ou no restaurante mais chique de Paris. 
          Em uma fila de shopping; no stress. Tão diferente dos tempos de colégio, onde começou a transbordar. 
          Pode acabar na praia, em meio a picolés e tangas, com areia por todos os lados. Num jardim de flores murchas, cheias de espinhos e grama alta.
          No olhar não trocado, ou pior, no olhar que não era para ti. No abraço não dado; no beijo que não foi consumado. 
          Quando distantes, e a saudade não aperta.
          O amor acaba; na padaria; na farmácia; dentro de um avião; ou até durante uma aula. No dia-a-dia, o encanto se quebra e a rotina nos mostra que talvez não fosse tão real quanto nós gostaríamos. 
          De vez em quando... Acaba e só. Só, ha, que contraditório. 
          Em meio a lençóis bagunçados; cabelos despenteados; e o desenlace de dois corpos. 
          Pode acabar no Chile, no Uruguai, ou aqui mesmo, no Brasil. 
          Entre cigarros que nem acesos foram. No toque do despertador. No vestido curto, o "amor" acaba; em meio ao machismo. 
          Ele termina ali. Nas palavras não ditas, nos sentimentos guardados; no tic-tac dos ponteiros; em madrugadas que antes, pareciam infinitas. 
          Nos remédios; na igreja; ou até numa maternidade. A qualquer hora, e a qualquer momento; o amor acaba.
          No troca-troca das cores do farol, que brincam; por dentre as ondas do mar; ou onde os sinos badalam. Não existe hora marcada, pois atrasado ou adiantado, uma hora ele chega: o tão temido fim.
          Nós nem nos preparamos e, num piscar de olhos; o amor acaba. 


inspiração: Texto "O Amor Acaba", de Paulo Mendes Campos 

quarta-feira, 31 de agosto de 2016

uma emoção diferente

            Algum tempo atrás, escrevi um texto sobre ponto de vista. Contei sobre meu trajeto de volta pra casa depois da escola, e a relação que criei com aquele caminho, o que ele influenciou em mim.
            O percurso é o mesmo, os lugares são os mesmos, mas a forma como eu olho para uma mesma situação pode ser diferente a cada dia. A mudança é em mim.
            Meu olhar para tudo aquilo pode ser influenciado pelo meu humor, por alguma situação que tenha acontecido naquele dia, por alguém, ou qualquer coisa do tipo. Depois de passar por aquelas ruas de tantos jeitos e com tantas emoções, entendi que quem decide a forma como vou atravessá-las sou eu.
            Em alguma de minhas voltas, comecei a pensar sobre o mundo. No quanto as pessoas tão precisando de uma aula sobre amor, na falta de empatia nessa sociedade de hoje em dia.
                                  
“ Companheira me ajude,
                                   que eu não posso andar só.
                                   Eu sozinha ando bem,
                                   mas com você ando melhor.”

            Atualmente, tenho ido a algumas manifestações. Eu adoro! Da uma emoção diferente, o coração bate forte; num ritmo que parece até calculado, demorado.
           Sinto-me fazendo parte de algo maior, de uma mudança maior. Ver todo mundo juntinho ali, lutando por uma transformação em nossa cultura, ah! É maravilhoso. Meu coração sabe que é isso que eu quero fazer para o resto da vida.
            Outro momento em que eu tenho essa sensação são as idas a EMEI, os encontros do OBA e as reuniões do instituto.
Com certeza terça-feira se tornou o melhor dia da minha semana. Encontrar as crianças deixa tudo melhor, o sorriso delas faz um bem danado.
Aos poucos, conforme as observei, percebi que a forma que elas lidam com problemas ou situações de uma forma muito melhor do que qualquer adulto.
Algo que gosto muito é a intensidade com a qual elas usam a imaginação. Triste ver que com o tempo as pessoas perdem o encantamento pela vida, não é?
 Confesso que depois de começar a fazer projeto, meu jeito de ver o mundo mudou, e a mudança continua constantemente. E esse é o tema desse ano: “outros jeitos de ver o mundo”. Podemos interpretar de várias formas.
Uma delas é a questão da empatia; imaginar a forma como o outro atravessa o caminho. Ou o seu próprio olhar que muda conforme sua vida acontece, e por isso se transforma a cada dia.
Gostaria muito de saber como as crianças da EMEI vão atravessar seus caminhos, e se eu influenciei em algo nisso. Porque acreditem, elas influenciaram muito no meu.

           
inspiração: escrevi esse texto para um evento da minha escola, colóquio, onde as pessoas que fazem projetos sociais iriam contar um pouco e conversar sobre esse tema

           



quinta-feira, 28 de julho de 2016

sutilezas

          Ali, detalhes foram se aglomerando, percebíamos sutilezas... Juntos fomos, aos poucos, descobrindo o mundo, nos descobrindo: crescendo.
          Santos, segundo dia de viagem, e todos cansados. Já havíamos feito entrevistas no centro histórico e visitado a Fortaleza Santo Amaro da Barra Grande. 
          Chegamos no porto por voltas das três da tarde. Descemos do ônibus e andamos um pouco; não me lembro muito bem da construção em si, mas me lembro das paredes brancas com anúncios pendurados, jornais e notícias sobre a cidade. Janelas de vidro, nos permitiam ver outros navios que estavam prontos para embarcar.
          Assim que todos entraram na escuna, observei ao redor. Como estávamos divididos em grupos de mais ou menos cinco pessoas, cada um se sentou em uma mesinha com seu monitor. Os professores ficavam próximos, caso houvessem dúvidas, iam passando por entre as mesas e conversando um pouco. 
          O Sol estava forte, e o calor ocupava o espaço. Já tínhamos lido sobre o porto, e olhado algumas coisas na apostila. Um de nossos professores, pediu a atenção de todos e explicou que discussões deveriam ser feitas, e nos passou a tarefa de anotarmos os containers que iam passando por nós. 
          Devagar, as pessoas foram se dividindo de seus grupos, todos foram tentar ver os navios que passavam, e faziam anotações nos cadernos ou apostilas. Quando paravam, estavam conversando sobre questões dadas pelos professores ou perguntas da apostila. 
          Os objetivos do trabalho eram principalmente entender o funcionamento do porto e a forma como ele influencia no resto da cidade. Mas, mais do que isso, conseguimos nos relacionar, quebrar grupos já formados na escola e conversar até chegarmos em conclusões. 
          Por um segundo, parei. Olhei em volta; vi professores, monitores, colegas; indo e vindo; aprendendo, ensinando, todos estavam participando de discussões, e naquele momento eu pude sentir: somos uma equipe. 
          Ali, detalhes foram se aglomerando, percebíamos sutilezas... Juntos fomos, aos poucos, descobrindo o mundo, nos descobrindo: crescendo.


inspiração: Escrevi esse texto o ano passado para uma aula de geografia, assim que retornamos de Santos. O encontrei em meio a um caderno de redação de 2015, e resolvi melhorá-lo para dividir com vocês. 

quarta-feira, 29 de junho de 2016

cúmplices

     Eram 10h47 de uma terça-feira, estávamos voltando à escola. as crianças da EMEI haviam gostado das brincadeiras hoje, algumas até me deram seus desenhos.
   Dentro da perua, meus colegas do projeto gritavam, cantavam e conversavam. normalmente eu estaria ali no meio, mas naquele dia eu só conseguia pensar na crônica que eu tinha que escrever pra aula de leituras sobre os refugiados e que eu os conheceria à noite.
     O dia passou, como geralmente passava; aula de matemática parecendo uma eternidade, correndo na aula de educação física, lendo na aula de português... até que finalmente 18h15, bateu o sinal e eu sai da sala. guardei meus materiais, passei no armário e dei tchau pra todo mundo, o mais rápido possível.
     Desci até a sala do Instituto, algumas outras representantes dos outros projetos já estavam lá, mas os refugiados não. arrumamos e discutimos alguns assuntos só entre a gente, e enfim, eles chegaram!
     Eram irmãos, um homem e uma mulher. eu que sou baixinha, ou ele era extremamente alto. pele negra, e com um olhar certeiro. vestia uma calça jeans, e um casaco bem grande por causa do frio. quando ele tirou o casaco, pude ver que ele estava com uma blusa do corinthians, que mais tarde ele nos contou que havia ganhado, e só usava porque ainda não tinha tantas roupas aqui, mas que não era torcedor não, e tomava cuidado para não apanhar na rua por causa de supostamente pensarem que ele é corinthiano.
    Ela usava uma saia jeans comprida e uma blusa estampada, com não muito mais do que 1,60. negra, com milhões de trancinhas e dreads no cabelo, com alguns penduricalhos coloridos que tinham as cores da Jamaica. mais tímida do que seu irmão e ainda não falava tão bem o português. descobri que ela era cozinheira quando ainda morava na África.
     Os dois eram bem simpáticos, porém ainda meio assustados com a situação. aos poucos, fomos conversando, perguntando e ele nos contava um pouco da cultura deles, de como são tratados aqui, do racismo que sofrem, do que é estar refugiado, e do que esperavam do projeto que iríamos desenvolver com eles.
    Sabe quando alguém te conta um problema, e enquanto fala, as lágrimas caem, uma a uma, e escorrem lentamente pelo rosto da outra pessoa, e isso causa uma dor pra você só de olhar? então, Jean nem chorou, mas sua voz nos transmitia tristeza, ele contava e nós sentíamos saudade alheia por seu país, por seus pais, sua família, por sua cultura.
     Ele falava, e a cada segundo eu concordava mais com Renato Russo e pensava: “Vamos celebrar a estupidez humana!”. eu me envergonhava de fazer parte de uma sociedade como a minha.
    Em meio aos pensamentos, sempre voltava a crônica que eu teria de escrever sobre refugiados e o quanto eu queria incluir aquilo tudo nela. mas eu não sabia como. até que eu vi uma cena.
     Eu vi; com meus próprios olhos. um olhar trocado que se transformou em sorriso. os dois irmãos, cresceram juntos, amadureceram, brincaram, choraram, e viveram juntos. agora estavam ali, dentro de uma escola, contando sua história triste a meros adolescentes.
     Até que se olharam e sorriram, era um olhar cúmplice; simples; não mais tão ingênuo, mas que transmitia dor. um olhar de quem passou por tantas coisas juntos e agora... haviam sido forçados a saírem de seu país. 
assim eu quereria a minha crônica, que fosse cúmplice, simples, e não mais tão ingênua, assim como aquele olhar.


inspiração: "A Última Crônica", Fernando Sabino 

quarta-feira, 18 de maio de 2016

mar

TALVEZNOFUNDOPEDROESPEREALGUMACOISAMAISLINDAMAIORQUEOMAR

eu espero,
você espera,
nós esperamos.

esperamos e sonhamos,
com alguma coisa mais linda
maior que o mar.

esperamos por um par,
pra dançar.
alguém que não nos deixe chorar.

podemos parar de procurar
e então,
começar a transbordar.

porque encontramos
alguém pra amar.
alguém que nos faz abobar.

podemos agora mostrar o luar,
e juntos,
sonhar.

e pra confirmar,
gritar,
até fazer o outro corar.

corar porque nós
esperamos e sonhamos,
com alguma coisa mais linda
maior que o mar.

seja eu,
você,
ou pedro,
todos nós,

esperamos por um par,
pra dançar,
alguém que não nos deixe chorar.


inspiração: esse poema na verdade é um presentin de aniversário para a minha amiga. ele surgiu no próprio dia do aniversário dela. essa frase do início (talvez no fundo pedro espere alguma coisa maior que o mar) veio de um cartaz, acho que feito pelo colegial da minha escola, e ficou em um dos murais por muito tempo; várias vezes eu tentava encaixar ele em algum texto ou sei lá, até que ele se enfiou, se transformando nesse poema, naturalmente.







terça-feira, 3 de maio de 2016

transbordar

          "Escorria, e as crianças sorriam.
          Era feliz, então sorria.
          E assim, aquele mundo cinza, coloria."

          - Se eu fosse uma gota de tinta, eu seria apenas uma gota de tinta, oras! - disse o coelho. - Que pergunta mais boba Alice!
          - Ah! Alguns a quem perguntei disseram que iriam colorir o mar ou o céu de outra cor. Me falaram também, que fariam parte de uma grande tela, chamada vida. Contaram-me que gostariam de deixar rastros por onde passassem, ou até fazer parte do equipamento fotográfico de um super profissional, cujo  trabalho é indicar lugares incríveis do mundo para viajantes inusitados.
          - Tudo isso é uma bobagem.
          - Bobagem é você dizer que seria "apenas uma gota de tinta", não seria apenas. Vida de gota de tinta não é fácil, sabia? Agora continue lendo a carta.

          "Hoje, eu sequei.
          Nostalgia da época em que eu fazia parte de um todo, éramos um pote de tinta cheio. 
          Tinta preta, adoro ser dessa cor.
          Conforme o tempo passava, eu via as pessoas, observava. Todas se satisfaziam de superfícies, vivendo de sentimentos pela metade, ou até sentimentos inventados.
          Eu não queria isso para mim, queria mergulhar, transbordar cor e calor, queria cada vez mais e mais sentir coisas reais, novas, inteiras.
          Escorri do pote, e pela primeira vez, pude ver, onde eu estava e entender certas coisas.
          Até que uma menina, ela sorria, me pegou com um pincel. Ele era meio áspero, e duro. Pra onde eu iria agora? 
          Ela passou o pincel por um cartaz, e eu respinguei. Eu estava sozinho agora. 
          Fiquei ali, até que:
          Hoje, eu sequei."

          - Alice, chega de besteira. Se eu fosse uma gota de tinta, querendo ou não, eu secaria. Agora vamos a um assunto mais importante: qual a semelhança entre um corvo e uma escrivaninha?

          "Escorria, e as crianças sorriam.
          Era feliz, então sorria.
          E assim, aquele mundo cinza, coloria."


inspiração: meu professor de português, Pedro, nos passou um exercício: se imaginar como algo que normalmente passaria despercebido no espaço. escolhi me imaginar como uma gota de tinta e aos poucos saiu essa crônica.
(depois fui perceber que se eu fosse um objeto, eu seria uma tinta, porque sou muito colorida e de vez em quando transbordo).  

quarta-feira, 20 de abril de 2016

ter ou não ter melhor amigo

     Quem não tem melhor amigo é alguém que não sabe o quanto o som de uma risada juntos pode fazer bem.
     Melhor amigo de verdade é muito difícil, pois não se conquista, a vida trás. 
     É muito raro. necessita de cuidado, tempo, fondue, confiança, música, incensos e redes.
     Ter um melhor amigo é como ter um cúmplice, a vida vai acontecendo, as pessoas vão falando, o mundo vai se renovando, as músicas vão tocando, a política mudando, o tempo passando, e vocês ali, parados, se divertindo com tudo isso numa esquina qualquer.
     Melhor amigo conhece todos os seus defeitos, dos pés a cabeça. Melhor amigo canta músicas ruins com você sempre só pra te animar, te entende só por um olhar, e pula carnaval com você. 
     Quem não tem melhor amigo, nunca vai entender o que é todos irem dormir na casa de um deles, e às 23h o coreano já ter tido que lavar a cabeça, suja de coca-cola pelos outros, umas três vezes.
     Nunca vai saber a emoção de ir em algum show com o seu melhor amigo, rir da cara de pessoas que estão lá empolgadas até demais e gritando loucamente, cantar bem alto a música que vocês mais gostam, ou ficar sem reação quando a mãe de um chora ao fim do show. 
     Só quem tem melhor amigo sabe o que é receber milhões de prints na madrugada sobre uma conversa importante. Você vira quase um psicólogo.
     Se você tem um melhor amigo, sabe o que é parar qualquer coisa que estiver fazendo se o outro estiver passando mal ou chorando, e ir abraçá-lo.
     Fazer cócegas no meio da aula, falar de séries que só vocês dois conhecem, dividir o mesmo gosto musical, e rir quando o outro diz alguma bobagem tão grande.
     Saber que vocês ainda vão passar tantas coisas juntos, irão em tantas manifestações, shows, carnavais. Vão amadurecer tanto juntos, crescer.
     Ter melhor amigo é ter intimidade o suficiente pra ficar em silêncio, sem ter uma necessidade de ter assunto o tempo todo. 
     É odiar essas pessoas que falam que não existe amizade entre meninos e meninas. 
     Você ai, se ainda não tem melhor amigo, espere, que a vida ainda te trará um.


inspiração: "Ter ou Não Ter Namorado", Artur da Távola